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A prática de assédio moral nas relações de trabalho

A prática de assédio moral nas relações de trabalho

http://www.copadvogados.com.br/edicao_43_pingo_dagua.pdf

Por Priscila Freitas Matheus Menegat e Thassia Menotti de Souza Araujo, advogadas do escritório Castro, Osório, Pedrassani e Advogados Associados.

O assédio moral ao longo dos anos vem se tornando assunto cada vez mais debatido em nossa sociedade - seja dentro do ambiente jurídico, dentro das empresas, bem como entre os próprios trabalhadores, intencionando compreender a razão pela qual tal prática se faz tão presente, nas relações de trabalho.  

No presente texto, pretende-se elucidar as formas de assédio moral, suas consequências e as medidas a serem adotadas para minimizar ou evitar essa situação.

                                Imperioso compreender inicialmente, o conceito de assédio moral trazido por Sérgio Pinto Martins:

O assédio moral é a conduta ilícita do empregador ou seus prepostos, por ação ou omissão, por dolo ou culpa, de forma repetitiva e geralmente prolongada, de natureza psicológica, causando ofensa à dignidade, à personalidade e à integridade do trabalhador. Causa humilhação e constrangimentos ao trabalhador. Implica guerra de nervos ao trabalhador que é perseguido por alguém. O trabalhador fica exposto a situações humilhantes e constrangedoras durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções.

Veja-se que a conduta do assediador deve ser repetitiva, ou seja, não é caracterizada como assédio moral uma situação isolada, que ocorra de forma eventual, ainda que o trabalhador possa sentir-se ofendido em decorrência desta situação, somente poderá ser considerado assédio moral o caso em que o empregado sofra de forma reiterada o assédio.

O assédio moral possui três formas diferentes: vertical descendente, vertical ascendente e horizontal. A primeira hipótese é a mais comum nas relações de trabalho, em que o assédio ocorre de cima para baixo, ou seja, o superior hierárquico assedia seu empregado. Já na segunda hipótese – vertical ascendente, o assédio ocorre de baixo para cima, caso em que o empregado, ou grupo de empregados, pratica o assédio contra um superior hierárquico. Por fim, há a hipótese de assédio moral horizontal, que ocorre entre os empregados de mesmo nível hierárquico. Salienta-se, que neste caso, se a empresa tiver ciência da situação, e não tomar nenhuma atitude, será conivente com o assédio praticado, e, portanto, também deve ser responsabilizada juridicamente.

Nesse sentido, pode-se trazer como exemplos de assédio moral, as seguintes situações: humilhações, ofensas, críticas habituais ao trabalho, controlar, limitando o horário de alimentação e utilização do banheiro, criar boatos visando macular a sua imagem, retirar as atividades do empregado (esvaziamento de funções), impedir o crescimento do empregado na empresa, dentre outros.

                                Diante de tal contexto, importante se analisar quais são as consequências para a vítima do assédio moral, as quais normalmente resultam no prejuízo a saúde física e psicológica. Segundo dados da Organização Mundial de Saúde, do ano de 2003, a maior parte dos trabalhadores vítimas de assédio moral, sofrem de transtornos mentais, tais como depressão, insônia, pânicos e fobias, e doenças como hipertensão arterial, taquicardia, gastrites, dentre outros.

Quanto aos transtornos mentais relacionados ao trabalho, cumpre informar que em diversos casos o empregado vítima do assédio moral acaba se tornando inapto ao trabalho, uma vez que se esgota sua capacidade psicológica para suportar a situação de assédio, o que pode ensejar o afastamento do trabalho, por auxílio-doença acidentário (espécie 91). Todavia, na maior parte dos casos, a Previdência Social não reconhece espontaneamente que o afastamento do empregado é de caráter acidentário, razão pela qual é necessário o ajuizamento de ação judicial a fim de obter o referido reconhecimento.

No aspecto, cabe ainda destacar que de acordo com os danos do INSS, os transtornos mentais ocupam a terceira posição entre as causas de afastamento do trabalho[2]. Ainda, segundo estudo da Organização Mundial de Saúde (OMS), no ano de 2020 a depressão será a doença mais incapacitante do mundo. 

No que tange as estatísticas referente aos casos de assédio moral no trabalho, conforme pesquisa realizada pelo site vagas.com, mais de 52% dos profissionais brasileiros já sofreram assédio moral no seu ambiente de trabalho, sendo que nestes casos 84% das situações foram praticadas pelas chefias das vítimas.  Na mesma pesquisa, 39,4% dos empregados vítimas de assédio não realizaram denúncia ou medida judicial, por medo de perder o emprego. Além disso, segundo o Ministério da Saúde, um processo por assédio moral é registrado a cada 55 horas.

Nesse mesmo sentido, deve-se mencionar que uma das espécies de assédio moral mais frequente, é o assédio sexual, que ocorre na maior parte das vezes com as funcionárias mulheres. Segundo dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT), no mundo, 52% das mulheres já sofreram assédio sexual no ambiente de trabalho.

Diante de tal contexto, questiona-se: o que a vítima pode fazer para tentar combater o assédio moral? A resposta para tal questionamento não é fácil e específica, uma vez  que cada caso é diferente de outro, contudo, há algumas medidas que podem ser tomadas, como: (i) anotar com detalhes as humilhações sofridas; (ii) tentar evitar conversar sozinho, sem testemunhas, com o assediador; (iii) tentar registrar por escrito as conversas com o assediador; (iv) gravar as conversar com o assediador.  

Além disso, o empregado vítima de assédio moral pode procurar assistência no sindicato de sua categoria, nas Comissões Internas de Acidente de Trabalho (CIPA), no Ministério do Trabalho e Emprego ou no Ministério Público do Trabalho, e, ainda, consultar um advogado caso pretenda tirar dúvidas ou ajuizar uma ação judicial postulando indenização por assédio moral.

Ressalta-se que até o presente momento não há uma lei específica que regulamente as questões relacionados ao assédio moral, contudo, existem diversas normas que pretendem assegurar a integridade psicológica do trabalhador, buscando punir o sujeito que cometa qualquer conduta que vise ofende-la.

No aspecto, cabe salientar que a Constituição Federal em seu artigo 1º, estabelece como um dos fundamentos da República Brasileira, “a dignidade da pessoa humana”. Já o artigo 5º, da mesma Constituição, dispõe no inciso X, que são invioláveis a honra e imagem das pessoas. Percebe-se que a conduta de assédio moral justamente acaba por violar os referidos artigos.

Ainda, os artigos 186 e 927 do Código Civil, asseguram que no caso de conduta ilícita que viole direito de outra pessoa, será obrigado a reparar tal situação. Ademais, há a convenção n. 155 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que em seu artigo 3º estabelece o termo saúde relacionado ao trabalho, que abrange não só as questões relacionadas a integridade física dos trabalhadores, mas também a sua integridade psicológica.

Por fim, até novembro do ano passado não existiam parâmetros para a fixação da indenização por dano moral (no qual o assédio moral está incluído), todavia, a partir de tal data entrou em vigor a Lei n. 13.467/2017 (Reforma Trabalhista), a qual classifica a ofensa sofrida pela vítima como de natureza leve, média e grave, bem como, estabelece no artigo 223-G, parágrafo 1º, que dependendo do grau da ofensa o pagamento da indenização ocorrerá pelo salário do ofendido até o limite de 50 vezes o último salário da vítima. Contudo, a constitucionalidade de fixação de valores limitados para indenização é questionável, podendo ensejar indenizações distintas do que limita a nova lei.

Portanto, diante do acima exposto, é possível perceber que o assédio moral se trata de fenômeno inserido em nossa sociedade atual, contudo, não se pode tolerar que tal situação se torne ordinária nas relações de trabalho, devendo existir militância efetiva dos trabalhadores no combate ao assédio moral, juntamente com as empresas – com a implementação de medidas de conscientização entre os seus empregados, a fim de que se possa erradicar, ou ao menos amenizar, os casos de assédio nas organizações.